Naquela época já existiam as redes de espionagem e o fato acabou repercutindo na Espanha, pois o interesse do ser humano pelo ouro e pela prata sempre foi muito grande. Os espanhóis, sabendo da investida portuguesa naquela região, que pelo tratado de Tordesilhas pertenceria à coroa espanhola, resolveu então enviar uma expedição que partiu de Cádiz em 8 de outubro de 1515, para investigar aquela história. Em fevereiro de 1516, comandados por Juan Diaz de Soliz, três caravelas chegaram em Punta Del Este. Este navegador de nome espanhol, era na realidade João Dias de Sólis, português que havia fugido de Lisboa por ter assassinado a esposa dele; sorrateiramente fugiu para a Espanha adotando nova cidadania. A expedição adentrou o Rio da Prata. Nas imediações da ilha Martin Garcia eles avistaram muitos nativos na margem do rio, que gesticulavam e gritavam enquanto acompanhavam a movimentação das naus. Então Soliz resolveu abordar aquele povo. Colocou em um bote oito marinheiros e, junto com eles, se deslocou para a margem a fim tentar conversar com aquele povo, achando que obteria informações mais precisas do que aquelas fornecidas para a expedição portuguesa pouco mais de um ano antes. Ocorreu que quando chegaram na margem foram cercados e mortos pelos nativos, que esquartejaram os corpos e devoraram aquela pequena guarnição. A tripulação que havia permanecido nas caravelas foi testemunha ocular daquele barbarismo. Resolveram então voltar. Depois da foz do rio tomaram rumo do norte, sendo que uma das caravelas ficou para trás. quando essa nau retardatária chegou na região onde fica a praia hoje denominada de Pinheira, manobrou para adentrar na baía sul e acabou naufragando devido as condições do local. Dezessete marinheiros sobreviveram (não se sabe exatamente o número). Esses sobreviventes se abrigaram na região hoje denominada Naufragados. Onze deles acabariam sendo presos logo depois por outra expedição de 1516 comandada por Cristóvão Jacques. Os outros seis (ou sete), ficaram por ali vivendo num lugar por eles denominado de Porto dos Patos, ali por onde hoje é a Enseada do Brito. Aqui é preciso novamente fazer uma pausa da narrativa. Conforme alguns mapas antigos a Ilha de Santa Catarina, naqueles tempos, era conhecida como Ilha dos Patos. Os índios Carijós que viviam por aqui, se adornavam com penas e foram chamados de "Patos". O nome atual Ilha de Santa Catarina foi dado por Sebastião Caboto em 1526.
Barra sul, Ponta do Papagaio, Ilha da Fortaleza Nsa. Sra. da Conceição de Araçatuba
Estes seis ou sete sobreviventes, acabaram convivendo com os carijós juntando-se com mulheres indígenas e com elas tiveram filhos. Entre esses sobreviventes estava Aleixo Garcia. Por lá ouviram as mesmas histórias que haviam sido contadas aos portugueses, pelos índios Charruas, sobre o tal povo serrano, muito rico que vivia distante dali, num lugar onde existiam montanhas muito altas etc... Levados pela curiosidade e pela ganância construíram um Bergantim, uma espécie de embarcação com remos, e ficaram percorrendo toda essa costa que vai de Santa Catarina até São Vicente em São Paulo. Os nativos de todas as tribos com que mantinham contato repetiam as mesmas histórias. Disseram mais... Contaram que havia um caminho que levava até aquele lugar, portanto, aquelas trilhas eram bem conhecidas de todos os povos nativos, possivelmente eram percorridas por eles desde a pré-história. Depois de ouvir tantas histórias confirmando a existência de riquezas tão grandes, em 1524 Aleixo Garcia, organizou uma expedição com dois mil índios. Previamente prepararam mantimentos, farinha de pinhão, farinha de marisco, favos de mel; iniciando essa magnifica caminhada de onde viviam, talvez próximo da foz do rio Maciambu, hoje município de Palhoça, que fronteia o sul da ilha de Santa Catarina, até o Peru. Chegaram muito próximo de Potosí, a cidade onde foi descoberta uma montanha de Prata com 600 m de altura. Chegando lá ele atacou os postos fronteiriços do império Inca, saqueando vários cestos de ouro e prata. Voltando com essas riquezas para o Brasil, ao atravessar o Rio Paraguai, a expedição foi atacada por uma tribo chamada Paiguás, que viriam a ser chamados de piratas do rio Paraguai, nesta emboscada morre Aleixo Garcia, sendo que a maior parte das riquezas que haviam sido saqueadas foram perdidas. Porém algumas das peças de ouro e prata chegaram a Santa Catarina através de dois sobreviventes: Henrique Montes e Melchior Ramires. Sabe-se que esse dois habitavam a ilha e quando passavam novos navegantes, espanhóis ou portugueses narravam a história para esses navegadores; inclusive Henrique Montes chegou mostrar as peças de ouro para o próprio Sebastião Caboto na expedição dele em 1526. Várias outras expedições tentaram repetir a façanha de Aleixo Garcia, entre elas: Sebastião Caboto, Diogo Garcia, Martin Afonso de Souza, todos tentando chegar pela via fluvial do rio da Prata, o que era muito difícil. Pero Lobo em 1531 tentou chegar a pé, pelo mesmo caminho de Aleixo, mas também foi morto pela mesma tribo de índios.
Então, depois de tantas frustrações, em 1539, Francisco Pizarro de uma forma incrível conquista o Peru. Essa é conquista é digna de nota, embora nada tenha a ver com nossa história sobre o caminho de Peabiru; pois ao chegar no Panamá, mais ou menos onde hoje situa-se o canal do Panamá, Pizarro comanda o desmonte dos navios, coloca os navios desmontados nas costas de escravos indígenas fazendo eles cruzarem o istmo por uma terra pantanosa, muito difícil de atravessar, chega no outro lado, remonta os navios, navega pela costa no oceano Pacífico chegando ao Peru. Francisco Pizarro e Seu Irmão Gonçalo Pizarro, aprisionam e matam o Inca Ataualpa, inundando a Europa com enorme quantidade de ouro e prata; tanta que mudou inclusive a economia, de um sistema mercantilista, para um sistema capitalista pela acumulação de riquezas. A partir dessa conquista histórica e por conta dela, todo esse cone sul, inclusive Buenos Ayres que havia sido fundada em 1534, foi abandonado por quase cento e cinquenta anos.
Essa é a narrativa extraordinária, que coloca Naufragados e região no início de uma jornada épica. Depois de conhecer tal história, fica difícil olhar para aquelas paisagens maravilhosamente azuis, sem que a emoção domine o meu espírito aventureiro. Lá encontro paz, enquanto a mente se agita ferozmente, tentando me ligar a outros tempos ou talvez a outras vidas. É muito difícil permanecer passivo, contemplando apenas as maravilhas naturais do lugar. Ali existiu (e ainda existe), vida em abundância. Depois que se fica sabendo a verdade sobre esse passado distante, os mortos ressuscitam e o tempo é contínuo. A mente foca a eternidade, vislumbrando todos aqueles índios emplumados, todos aqueles aventureiros e suas histórias fantásticas. Todos navegam em uma gigante caravela fantasma, repleta de emoção; muito diferente dos navios cheios de tecnologia e comunicação via satélite que hoje conhecemos. Foi um tempo em que a vida era realmente uma aventura, embora tensa em sua barbárie. Enfrentando o desconhecido, sem temor, sem ajuda, levados apenas pela intuição, aqueles seres humanos, apesar de brutos, deixaram para nós essa herança de conquistar o imaginário. Dá vontade de abandonar tudo e trilhar novamente aqueles caminhos bravios. Mas o mundo mudou! hoje dispomos de meios de transportes para qualquer situação, temos celulares, GPS, incríveis APPs. Qualquer caminho pode ser planejado milimetricamente. Somos totalmente dependentes da tecnologia, nos acostumamos ver a vida passando em uma telinha. Somos apenas espectadores enquanto eles, aqueles humanos antigos, foram protagonistas. Tá difícil segurar a mente... Preciso voltar para Naufragados!
Mesmo desmistificando algumas teorias, que dizem haver caminhos Incas aqui dentro da nossa ilha, mesmo não tendo certeza de que tudo o que aqui foi escrito está cem por cento correto, mesmo sabendo que muito ainda precisa ser pesquisado, o enredo é esse mesmo. Se alguém quiser saber mais vai ter que procurar nos livros e narrativas de outros historiadores. Que essa história de hoje atinja os corações e as mentes acomodadas.
Que Sejam todos bem vindos ao mundo fascinante da aventura!
Referências bibliográficas
Caminho de Peabiru - Canal Buenas Ideias - Youtube
Náufragos Traficantes e degredados - As primeiras expedições ao Brasil - Eduardo Bueno
Reinhard Maark e o caminho de Peabiru no Paraná
Luciano Azambuja - IFSC - Youtube
Caminho de Peabiru - De lá pra cá - Youtube
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